quarta-feira, dezembro 07, 2005

Fé e política

Esta reflexão, de além Atlântico, parece-me interessante para iluminar o nosso quintal, deixando-nos umas interrogaçõezitas no ar:
O texto é de frei Beto, famoso teólogo Dominicano brasileiro.
«Fé e Política
(...) O Brasil é caso raro de formação de militantes políticos a partir da fé cristã. Isso se deve às Comunidades Eclesiais de Base, às pastorais populares, à Teologia da Libertação. A novidade é que jamais houve a tentação desses cristãos formarem um partido confessional, com o é, na Itália, o PDC, Partido Democrata Cristão.
Política, Estado ou partido não pode ser confessional, segregando quem não professa a mesma fé. Este o erro dos partidos comunistas oficialmente ateus: professavam uma confessionalidade às avessas, elevando a descrença à condição de critério de ingresso em suas fileiras. Ficavam excluídos os revolucionários dotados de convicções religiosas. E também o povão, visceralmente religioso.

A laicidade das ferramentas políticas é uma conquista importante da modernidade. O que não significa relegar a fé à esfera privada. Como propõe o Movimento Nacional Fé e Política, deve-se saber articular a crença com a ideologia, o espaço eclesial com o político, sem que um queira invadir ou excluir o outro. Para os cristãos, a fé é a luz que os orienta em suas opções éticas e em seu projeto de sociedade centrado no princípio evangélico de que "todos tenham vida e vida em plenitude" (João 10, 10).
(...)
O Movimento Fé e Política, fundado no início dos anos 80, é atípico: não tem filiados nem burocracia e, no entanto, multiplica-se Brasil afora em inúmeros núcleos. São militantes de partidos, sindicatos, movimentos populares, ONGs, entidades do terceiro setor, que se interessam por equacionar sua vocação cristã com os desafios políticos. Aos encontros cada um chega por conta própria e a hospedagem é na casa do povo da região, convivência que facilita o intercâmbio e reduz os custos.

Por que Profetismo e Poder? Todos os profetas bíblicos foram políticos. Isaías atuou, no século VIII a.C., na corte de quatro reis de Judá: Ozias, Joatão, Acaz e Ezequias. Os primeiros doze capítulos de seu livro tratam, de modo especial, da arrogância e da hipocrisia dos governantes. Jeremias, no século seguinte, assessorou o rei Sedecias, que mais tarde o prendeu. Morreu exilado no Egito. Amós, talvez anterior a 750 a.C., denuncia a injustiça social e o terrorismo internacional.

É lamentável que os textos proféticos sejam tão atuais. Como temos evoluído pouco! Vejamos alguns exemplos: "Como se transformou em prostituta a cidade fiel! Antes era cheia de direito e nela morava a justiça; agora está cheia de criminosos! A sua prata se tornou lixo, o seu vinho ficou aguado. Seus chefes são bandidos, cúmplices de ladrões; todos gostam de suborno, correm atrás de presentes, não fazem justiça ao órfão e a causa da viúva nem chega até eles" (Isaías 1, 21-23).

Jeremias conclama a corte do rei de Judá: "Pratiquem o direito e a justiça. Libertem o oprimido da mão do opressor; não tratem com violência nem oprimam o imigrante, o órfão e a viúva; e não derramem sangue inocente" (22, 3). Amós não é menos incisivo: "Vendem o justo por dinheiro e o necessitado por um par de sandálias; pisoteiam os fracos no chão e desviam os pobres do bom caminho! Pai e filho dormem com a mesma mulher, profanando assim o meu nome santo. Diante de todos os altares eles se deitam sobre roupas penhoradas e no templo de seu deus bebem o vinho dos juros" (2, 6-8)

in http://www.adital.com.br/site/noticias/20207.asp?lang=PT&cod=20207