sexta-feira, fevereiro 03, 2006

Por falar em relações sexuais...

A homilia do Pd. Luis Carlos, no Domingo passado, acerca da 2ª leitura, deixou-me a pensar…
Nessa leitura – 1ª Cor. 7, 25-40 - Paulo escreve sobre o casamento, o celibato e a própria virgindade e, em suma, ensina mais ou menos o seguinte:
i - Não há «mandamento do Senhor» quanto ao tema;
ii – A opção por qualquer dos estados deve ser totalmente livre e adequada à pessoa que a toma.
iii – Qualquer opção (celibato livre ou casamento livre) é boa.
iv – A opção livre pelo celibato é melhor, na medida em que permite ao celibatário a dedicação exclusiva a Deus e à preparação da Sua vinda (não se inclui aqui o celibato que, fruto das circunstâncias, não resulta de uma opção livre. Nesse caso o celibatário ocupa-se em fantasias e frustrações que não o fazem feliz e o impedem de se entregar a Deus e ao próximo …).
Crente numa próxima parúsia, Paulo não se preocupa grandemente em organizar na terra a cidade, ou o Reino de Deus (dessa tarefa encarregar-se-ia Sto. Agostinho).
Numa lógica escatológica, afirma, com alguma razão, que aquele que não é celibatário tem de se dedicar ao seu cônjuge e aos filhos, tomando parte do seu tempo e energias em trabalhos e preocupações que, noutras circunstâncias, poderiam ser dedicados mais generosamente a uma maior quantidade de pessoas e à preparação da (já próxima) vinda do Senhor.
E Paulo tinha razão, apesar de olvidar, melhor…, apesar de ignorar – porque não podia conhecer – a faceta conjugal e mesmo erótica do amor, a qual pode levar um casal à experiência da entrega completa, vivendo, em relativa plenitude, uma comunhão entre si e entre si e o universo, em união com Deus e em fugaz e antecipatória experiência da denominada «comunhão dos santos».
Tal dimensão e experiência são virtualmente impossíveis de alcançar no genuíno celibato, mesmo no livremente voluntário (que no outro nem se fala), pelo menos na dimensão física e sensual - que felizmente também temos (alguém se lembra do filme do Wim Wenders – As asas do desejo?) -, e que também pode e deve ser santificada.
Nessa parte, aquele que abraça livremente o celibato, ou aquele que, embora casado, não chega a conhecer verdadeiramente a entrega e o amor conjugal, não está em condições de entender tal dimensão do amor, divino.
Ora, como referiu o Pd. Luis Carlos, esta posição de S. Paulo torna-se (teológica ou doutrinariamente) possível porque o povo de Deus da Nova Aliança já não é uma raça.
Para os judeus a fertilidade era determinante.
Era, como hoje, uma questão de sobrevivência enquanto povo.
Nessa medida, e ao contrário do que muitos pensam, o celibato não era bem visto e a infertilidade era estigmatizada.
Cristo, Ele próprio celibatário, instituiu a Igreja - um povo de homens e mulheres convertidos, provenientes de todas as raças, povos, nações e condições.
Um povo que aumenta com a evangelização e proselitismo dos seus membros já não precisa de se preocupar com a taxa de natalidade…
Nestas circunstâncias, é compreensível que Paulo prefira aquele que converte e baptiza do que aquele que gera filhos, principalmente porque a vinda do Senhor está próxima, e há que salvar o maior número de pessoas…

E o que é que tudo isto tem que ver com Portugal, com a Europa e com os recentes incidentes em França?
Pois bem, ocorreu-me que, enquanto povo (português, francês, ou, digamos, europeu) não temos saída.
Somos cada vez menos, e seremos cada vez menos.
Políticas de incentivo à maternidade, totalmente inexistentes em Portugal*1, são meros paliativos e apenas atrasarão o desfecho.
Não estamos, ainda, como os judeus da altura, sob o domínio directo de outro povo… mas estamos condenados, porque não nos reproduzimos.
Se não nos podemos manter como raça – aliás, a ciência já tratou de desmentir e de esvaziar o conceito -, resta-nos a imigração, que pode descaracterizar-nos.
Ora, e aqui é que está o ponto, assim como Cristo estende a aliança de Deus aos gentios, pedindo a sua conversão, porque não poderemos nós estender a Portugalidade àqueles que nos escolhem como país de acolhimento, quase actualizando ideias líricas ou caducas, como a do V Império, numa vertente mais espiritual ou cultural, ou como a de um Portugal Universal, constituído por vários povos, do Minho a Timor, numa vertente mais física e demográfica?
Porque não havemos de legalizar realmente os imigrantes, integrando-os plenamente na nossa sociedade, exigindo-lhes, em contrapartida, que aprendam a nossa língua e a nossa cultura, que cantem o nosso hino, que respeitem a nossa bandeira e os nossos valores*2, que jurem a nossa Constituição, e mesmo que integrem as nossas F.A.?
Em suma, que se tornem voluntariamente portugueses, por sua própria escolha, sem deixarem necessariamente de ser ucranianos, moldavos, chineses, indianos, paquistaneses, guineenses, angolanos, cabo-verdianos e brasileiros.
Teríamos, evidentemente, que mudar de mentalidade, aprendendo a acolhê-los como iguais, mas a variedade fortalecer-nos-ia, tanto mais que fomos, sempre fomos, especialistas e percursores em miscigenação e ainda nos resta algum espírito universalista.
Dirão alguns espíritos mais sensíveis que isso não é democrático... Não é verdade. Se as regras forem conhecidas, só virá quem quiser.
A sociedade mais democrática e plural do mundo, a Norte Americana, é isso mesmo que faz.
Salvo excepções, nela, os imigrantes consideram-se, são tratados e agem como americanos, e isso faz a sua força e toda a diferença.
No fundo aplicaram na política e na cidadania os ensinamentos de Cristo, e do seu apóstolo Paulo.
Na Europa, pelo contrário, vivemos acossados, com medo do outro, simultaneamente arrogantes com a putativa superioridade da nossa cultura e, ao mesmo tempo, com tanta vergonha dela que não a queremos assumir, ou sequer defender.*3

P.S. *1 - Até nisso somos estúpidos, e nesse aspecto estamos bem acompanhados por Espanha. Ao invés de apoiarmos a maternidade e as famílias, através das denominadas políticas pró-activas, tratamos de as perseguir, apoiando e promovendo denodadamente, em alternativa, uma organização de sociedade que dificulta a reprodução, e a vida em família. A homossexualidade deixou, e muito bem, de ser perseguida, para passar a ser promovida; os mesmos grupos do costume, embora minoritários, pressionam ainda e sempre a legalização do aborto; só se fala de morte, e não de vida; os governos continuam a onerar fiscalmente as famílias; a organização do território obriga as pessoas a passarem boa parte do tempo em deslocações de casa para o trabalho, e vice-versa; a organização do trabalho, e a nossa fraca produtividade, obrigam-nos a estar horas infindas no emprego, impedindo a nossa ausência; a televisão e o consumismo dominantes anestesiam-nos; as relações humanas cada vez são mais electrónicas ou virtuais, etc. Em suma, e como diz o outro, nunca se falou tanto de sexo, e nunca se praticou tão pouco… e quem diz sexo diz romance, amor, amizade, laços familiares, etc. Não temos tempo para nada, nem ao menos para escrever uma treta qualquer no Blogue :-)
*2 - A excisão, p.e. é intolerável, mas tem sido praticada amiúde em Portugal, com a nossa vergonhosa complacência.
*3 - Veja-se o triste caso do preâmbulo da constituição da UE, que não podia mencionar a génese e influência judaico-cristãs na cultura e pensamento ocidentais, para não susceptibilizar alguns fundamentalistas da laicidde dos estados.

A propósito de estatísticas, com um título destes, tenho a certeza que este foi o postal mais lido :-)